O Irã conseguirá ser uma potência nuclear? Parte II: o Programa Nuclear Iraniano e as possibilidades de cooperação com Coreia do Norte e Paquistão após a Guerra dos Doze Dias.
- Alexandre Tito Xavier
- 29 de jun.
- 5 min de leitura

Introdução
A recente Guerra dos Doze Dias, 13 a 24 de junho, entre Israel e Irã, com envolvimento dos EUA e encerrada, até o momento, com um cessar-fogo frágil, em nossa visão, acentuou ainda mais a centralidade do programa nuclear iraniano como um dos principais fatores desestabilizadores no Oriente Médio, juntamente com a problemática sobre a criação do Estado palestino, o que não será permitido por Israel. Convém relembrar que o Irã foi o único Estado a atacar diretamente o território israelense desde a Guerra do Yom Kippur em 1973.
O conflito, caracterizado por ataques diretos entre os dois Estados e ações encobertas de sabotagem e guerra cibernética, intensificou a percepção de que Teerã, diante de crescentes ameaças existenciais, poderá acelerar seu programa nuclear, buscando alcançar uma capacidade militar dissuasória. Em paralelo, a decisão recente iraniana, 28 de junho, de romper com os mecanismos de verificação da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), proibindo câmeras de monitoramento e limitando inspeções, reforça os temores da comunidade internacional quanto à militarização iminente de seu programa atômico.
Nesse sentido, à luz dos recentes desdobramentos e com base em referências analíticas publicadas, em nossos artigos, como: "A nova configuração do Oriente Médio: Bipolaridade Irã x Israel – Parte V: E agora?", "O Irã conseguirá ser uma potência nuclear? " e "O aumento da tensão entre Israel e Irã: possível ataque pelos EUA ao programa nuclear iraniano", disponíveis respectivamente em https://www.atitoxavier.com/post/a-nova-configuração-do-oriente-médio-bipolaridade-irã-x-israel-parte-v-e-agora; https://www.atitoxavier.com/post/o-irã-conseguirá-ser-uma-potência-nuclear; e https://www.atitoxavier.com/post/o-aumento-da-tensão-entre-israel-e-irã-possível-ataque-pelos-eua-ao-programa-nuclear-iraniano; esta análise examinará as probabilidades de o Irã receber apoio técnico e logístico da Coreia do Norte ou do Paquistão, bem como a viabilidade de Teerã continuar avançando autonomamente rumo à sua nuclearização militar.
O contexto estratégico do programa nuclear iraniano
Desde o reinício do enriquecimento de urânio em níveis superiores aos limites do Acordo Nuclear de 2015 (JCPOA), o Irã tem promovido uma política deliberada de ambiguidade estratégica. A guerra dos doze dias reforçou o sentimento de isolamento de Teerã frente à possível aproximação israeli-saudita e à aliança operacional com os EUA. Conforme argumentado no nosso artigo "O Irã conseguirá ser uma potência nuclear?", a busca iraniana pela bomba é compreendida tanto como uma forma de garantir a sobrevivência do regime quanto como instrumento de projeção regional de poder, bem como de dissuasão estratégica.
Portanto, a decisão iraniana de proibir as câmeras da AIEA, noticiada pelo Metrópoles (https://www.metropoles.com/mundo/embaixador-do-ira-diz-que-pais-rompera-com-agencia-nuclear-da-onu) e Poder360 (https://www.poder360.com.br/poder-internacional/ira-proibe-inspecoes-de-agencia-da-onu-em-instalacoes-nucleares/), representa um divisor de águas: sem os mecanismos de verificação, o tempo de alerta para um armamento nuclear completo poderá ser reduzido de meses para semanas, sem qualquer aviso à comunidade internacional.
Potenciais apoios externos: Coreia do Norte e Paquistão
Coreia do Norte:
A Coreia do Norte, em nossa percepção, é o candidato mais provável para oferecer apoio técnico clandestino ao Irã. Ambos os países enfrentam sanções severas, compartilham uma postura revisionista em relação à ordem internacional liberal liderada pelos EUA e mantêm histórico de cooperação em mísseis balísticos e tecnologias de enriquecimento.
Historicamente, o Irã e a Coreia do Norte possuem uma parceria estratégica no tocante ao desenvolvimento da tecnologia relacionada à mísseis balísticos. Fontes abertas apontam intercâmbios científicos clandestinos, com engenheiros norte-coreanos vistos em instalações iranianas, conforme podemos ver em https://oglobo.globo.com/mundo/coreia-do-norte-ira-comercializam-tecnologia-missil-2769779, https://www.gazetadopovo.com.br/mundo/coreia-do-norte-e-ira-voltaram-a-trabalhar-juntos-no-desenvolvimento-de-misseis/, https://www.unitedagainstnucleariran.com/north-korea-iran e https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/deutschewelle/2025/06/25/depois-do-ira-coreia-do-norte-pode-ser-a-proxima.htm. Além disso, a crescente aproximação entre Teerã e Moscou pode ainda favorecer uma triangulação entre Irã, Coreia do Norte e Rússia, com benefícios mútuos frente ao cerco ocidental.
Logo, em nossa opinião, a probabilidade de apoio norte-coreano é alta, em virtude das seguintes justificativas:
Interesses convergentes na erosão da ordem ocidental;
Precedentes históricos de cooperação em vetores balísticos; e
Incapacidade das potências ocidentais de fiscalizar canais clandestinos.
Paquistão:
O caso do Paquistão é mais complexo. Embora o cientista paquistanês Abdul Qadeer Khan tenha sido acusado de transferir tecnologia nuclear para o Irã nos anos 1990, conforme podemos ver em https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/pai-do-programa-nuclear-do-paquistao-abdul-qadeer-khan-morre-aos-85-anos/, o atual governo paquistanês, pressionado por laços econômicos com os EUA e rivalidades com a Índia, mantém posição ambígua. Assim, acreditamos que Islamabad não tem interesse em abrir uma nova frente regional instável, especialmente ao lado de seu rival saudita — feroz opositor de uma bomba iraniana.
Ademais, o Paquistão deseja manter seu próprio status de única potência nuclear islâmica, o que poderia ser ameaçado por uma bomba iraniana.
Assim, somos de opinião de que a probabilidade de apoio paquistanês é baixa, em razão das seguintes razões:
Pressões dos EUA e Arábia Saudita;
Interesse em preservar hegemonia nuclear islâmica; e
Riscos de isolamento diplomático.
Viabilidade de desenvolvimento autônomo
Como argumentado por nós em "O aumento da tensão entre Israel e Irã: possível ataque pelos EUA ao programa nuclear iraniano", o Irã já possui conhecimento técnico acumulado, capacidade de enriquecimento e pessoal qualificado para desenvolver uma arma nuclear de forma autônoma. A presença de centrífugas IR-6 e IR-8, mais modernas, permite enriquecimento mais rápido e eficiente. O principal gargalo é político, não técnico.
Com o recente rompimento do Irã com a AIEA e a suspensão da cooperação técnica internacional, Teerã sinaliza que prefere atuar com autonomia, reduzindo a exposição e os riscos de vazamentos de informação, tendo mais liberdade de ação. Entretanto, tal decisão abre a oportunidade para novos ataques provenientes de Israel e dos EUA.
Assim sendo, inferimos que a probabilidade de avanço autônomo é muito alta pelos motivos relacionados abaixo:
Conhecimento técnico consolidado;
Risco de cooperação externa ser interceptada; e
Desejo de manter soberania sobre o programa.
Israel, EUA e a janela de oportunidade
A janela estratégica para Israel ou os EUA realizarem novos ataques preventivos está se fechando rapidamente. A guerra dos doze dias demonstrou que a retaliação iraniana pode ocorrer em múltiplos teatros simultâneos — Líbano, Síria, Gaza, Cisjordânia, Mar Vermelho — o que pode levar o Oriente Médio a um caos. Contudo, como ressaltado por nós em "A nova configuração do Oriente Médio: Bipolaridade Irã x Israel – Parte V", a bipolaridade Irã-Israel poderá conduzir a uma guerra mais ampla, com armamento nuclear no horizonte ou a uma maior estabilidade regional, pois a alguns analistas advogam que a posse de armas nucleares pelo Irã criaria um equilíbrio de poder na região, onde nenhum país se sentiria seguro para atacar outro com a ameaça de retaliação nuclear.
Dessa forma, acreditamos que poderá ocorrer novos ataques ao Irã, caso o governo iraniano não negocie o seu programa nuclear com o Ocidente.
Conclusão
O Irã encontra-se em um ponto de inflexão geoestratégico. Após a Guerra dos Doze Dias e a suspensão da cooperação com a AIEA, as probabilidades de Teerã desenvolver armas nucleares aumentaram significativamente. Com apoio provável da Coreia do Norte e baixa dependência de Islamabad, o país poderá tender a optar por um caminho autônomo, acelerando seus esforços clandestinos rumo ao status de potência nuclear.
Portanto, este cenário impõe dilemas profundos à arquitetura de segurança regional e internacional, uma vez que a presença de uma bomba iraniana redefiniria o equilíbrio de poder no Oriente Médio, provavelmente desencadeando uma corrida armamentista regional e tornando os conflitos futuros ainda mais destrutivos.
Assim, é esperado que haja uma continuação do conflito entre Israel - Irã - EUA, caso haja indícios que os iranianos estejam continuando com o seu programa de nuclearização militar.
Qual a sua opinião?
Seguem algumas matérias para ajudar as nossas análises:
Matéria de 24/06/2025:
Matéria de 29/06/2025:
Matéria de 28/06/2025: