No dia 24 de outubro ocorreu no Golfo de Omã mais um episódio de tensão entre um navio da US Navy e meios navais da Guarda Revolucionária do Irã - GRI ou Islamic Revolucionary Guard Corps Navy.
Esse recente episódio possui diferentes versões, o que era esperado, conforme podemos ver abaixo:
- o Irã alega que impediu a apreensão do navio tanque, de bandeira vietnamita, contendo um carregamento de óleo iraniano pela US Navy, e acusam os estadunidenses de estarem realizando atos que violam o Direito do Mar e a Convenção das Nações Unidas, e que a tentativa de apreensão seria um ato de pirataria e de terrorismo. Tais alegações podem ser exemplificadas pela manifestação abaixo da GRI:
"With the timely and authoritative action of the Guards naval forces, the U.S. terrorist Navy's operation to steal Iranian oil in the Sea of Oman failed" (disponível em https://www.reuters.com/world/middle-east/iranian-state-tv-says-iran-thwarts-us-attempt-steal-oil-sea-oman-2021-11-03/)
- os EUA desmentem a afirmação dos iranianos e informam que estavam acompanhando e monitorando a captura do navio pela GRI, conforme as palavras do Secretário de Imprensa do Pentágono John Kirby:
"I've seen the Iranian claims. They are absolutely, totally false and untrue [...] Iran's actions … constitute a blatant violation of international law. It undermines the freedom of navigation and the free flow of commerce. The only seizing that was done was by Iran" (disponível em
https://www.voanews.com/a/pentagon-iran-s-claims-that-us-tried-to-seize-tanker-false-/6298927.html )
Apesar da Guerra de Informações entre esses países, é nítido o encontro entre os meios navais, e o clima de tensão reinante no episódio. Além disso, vemos que os vídeos iranianos foram editados, visando demonstrar uma "vitória" sobre o seu inimigo (EUA).
Em que pese o evento ter ocorrido no dia 24 de outubro, o vídeo só foi divulgado pelas mídias iranianas no dia 03 de novembro, véspera da comemoração iraniana da tomada da embaixada estadunidense por estudantes que ocorreu em 04 de novembro de 1979 e que foi um símbolo do triunfo da revolução islâmica no Irã.
Na visão do Blog isso teve o objetivo de reforçar a posição do governo perante a opinião pública iraniana, demonstrando força e reforçando a ideia de resistência contra a postura ocidental de subjugar o Irã. Ademais, os vídeos também têm a intenção de enviar uma mensagem a comunidade internacional de que o Irã é uma potência regional e que merece ser respeitada, ainda mais devido as disputas geopolíticas que possui com a Arábia Saudita e Israel.
A nossa análise coincide com a de outros analistas como a de Dorsa Jabbari, disponível em https://www.aljazeera.com/news/2021/11/3/iran-says-halted-us-navy-seizing-oil-tanker-in-sea-of-oman:
“The government clearly want to send a message to the Americans that they are the strongest force in the region and that they are not scared by the US presence in the Sea of Oman or in the Strait of Hormuz”
Incidentes entre os EUA e o Irã nessa região não são incomuns, conforme descrevemos no artigo: "Estreito de Ormuz: importância geopolítica e fonte de tensão constante", disponível em https://www.atitoxavier.com/post/estreito-de-ormuz-importância-geopolítica-e-fonte-de-tensão-constante, em que afirmamos que o Estreito é estratégico, e caso algum país detivesse o seu controle de acesso, ele poderia ter influência no preço do petróleo, tornando-se um ator global estratégico. Atento a isso, e visando aumentar a sua influência na região e no mundo, o Irã, rotineiramente, tenta exercer equivocadamente sua soberania na área, o que torna a região conflituosa. Nesse sentido a US Navy realiza a Freedom of Navigation Operations - FONOPs, visando evitar o controle iraniano, e assim manter o Estreito aberto a navegação. Tal fato aumenta a tensão entre esses países, ainda mais quando os navios da GRI realizam manobras de intimidação aos navios militares estrangeiros, onde qualquer erro de uma das partes poderia causar um incidente diplomático/militar de grandes proporções.
Na constante disputa de narrativas entre esses países, o governo de Teerã afirma que a presença da US Navy tem a intenção de desestabilizar a região, e com isso atingir os seus objetivos geopolíticos.
Durante o governo Trump (2017 - 2021) houve o aumento da tensão nessa área marítima, e mesmo com a ascensão de Biden não ocorreu a diminuição desses episódios de intimidação ou harassment entre os meios navais estadunidenses e iranianos.
Existem vários relatos de apreensão de navios mercantes iranianos por meios da US Navy, visando cumprir as sanções econômicas impostas pelos EUA ao governo de Teerã, devido ao desenvolvimento do programa nuclear iraniano. Por outro lado, o Irã também apreendeu navios mercantes ocidentais como medida de retaliação contra atos aos seus navios, o que demandou a presença, a partir de 2020, de meios navais de diversas marinhas, como a britânica e a sul coreana, escoltando seus mercantes que transitassem pelo Golfo Pérsico.
Esse episódio, na opinião do Blog, exemplifica o uso da Diplomacia das Canhoneiras por parte dos EUA, com o intuito de fazer valer a imposição das suas sanções econômicas ao Irã, bem como a importância de se ter uma Força Naval que possa tentar se contrapor a isso, exercendo a sua soberania e exercendo um certo grau de dissuasão. Ademais, não podemos esquecer que a proximidade do incidente aos sistemas de mísseis iranianos contribui para a dissuasão, fazendo com que seja evitada uma maior escalada da crise.
Convém mencionar que está prevista para 29 de novembro, em Viena, a retomada das negociações sobre o Joint Comprehensive Plan of Action (JCPOA), que é um plano de ação que trata sobre a implementação do programa nuclear iraniano para fins pacíficos, e que, para os interessados, pode-se ter mais detalhes em https://www.armscontrol.org/factsheets/JCPOA-at-a-glance. Para esse encontro existe a expectativa da presença estadunidense, e um possível alívio das sanções.
O Blog acredita que os EUA continuarão a realizar as FONOPs na região, bem como a GRI manterá o harassment contra os meios navais, que transitarem pelo Golfo Pérsico, de países que apoiam o embargo, e que dependendo do grau das sanções econômicas impostas aos iranianos, os incidentes de tensão e de crise nessa região marítima poderão aumentar ou serem atenuados.
Nesse sentido, a Guerra de Informações sobre os incidentes nessa região entre os EUA e o Irã continuarão a existir.
É importante pontuar que os iranianos estão a cada dia mais próximos da China e da Rússia, o que contribui para o aumento da confiança de Teerã.
Sugerimos a leitura dos artigos do Blog que estão na Seção Oriente Médio e que tratam dos temas abordados no artigo, e que podem ser acessados em https://www.atitoxavier.com/my-blog/categories/ori-m%C3%A9dio.
Qual a sua opinião?
Seguem alguns vídeos para auxiliar a nossa análise:
Matéria de 04/11/2021:
Matéria de 03/11/2021:
Matéria de 03/11/2021 (esse vídeo contém uma versão totalmente favorável ao Irã):
Matéria de 04/11/2021:
Matéria de 03/11/2021:
Matéria de 23/11/2021 (nesse vídeo podemos identificar um dos navios da GRI empregados no evento):