No dia 25 de maio de 2022, o Brasil deu um importante passo para o controle de sua soberania com o lançamento, nos EUA - Centro Espacial Kennedy, dos primeiros satélites do Programa Lessonia - 1, pertencente ao Programa Estratégico de Sistemas Espaciais - PESE, de responsabilidade da Força Aérea Brasileira - FAB, criado para atender às necessidades estratégicas das Forças Armadas e da sociedade brasileira.
O Programa Lessonia é destinado a estabelecer uma constelação de satélites de órbita baixa.
Os satélites lançados, denominados Carcará I e II, irão contribuir, de forma relevante, para o controle da situação ambiental, verificando possíveis focos de desmatamento, bem como o monitoramento das fronteiras do nosso país, tanto na parte ocidental (terrestre e fluvial), quanto na parte oriental (ambiente marítimo na Zona Econômica Exclusiva - ZEE). Esses satélites foram lançados por meio do foguete Falcon 9 da empresa SpaceX pertencente a Elon Musk.
A tecnologia finlandesa, synthetic-aperture radar (SAR) ou tecnologia radar, empregada nos Carcará I e II permitirá a visualização de imagens em alta resolução e terá caráter dual, ou seja, poderá ser usada pelos meios civil e militar. Além disso, permitirá a utilização em diversas finalidades, como atualização cartográfica, apoio às forças de segurança no combate aos crimes transnacionais, dentre outras.
O vídeo a seguir mostra a tecnologia que será empregada nos satélites adquiridos da empresa ICEYE:
Nesse sentido, é um marco muito importante para o aprimoramento do controle e monitoramento da nossa soberania nos ambientes terrestre e marítimo. Destarte, poderá contribuir com o Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul - SISGAAz, que será extremamente importante para o monitoramento da nossa fronteira oriental - Atlântico Sul, e que o Blog vem constantemente alertando sobre a sua premência e relevância.
O vídeo abaixo da ICEYE nos mostra a possibilidade da tecnologia empregada para o SISGAAz:
Entretanto, ao olharmos os discursos sobre o lançamento e as matérias nas mídias jornalísticas verificamos que é priorizada a defesa da região amazônica, corroborando as nossas análises sobre a pequena mentalidade marítima que, infelizmente, temos, e que precisamos mudar de forma decisiva, pois possuímos uma grande vulnerabilidade em nossa fronteira oriental, como podemos observar em vários dos nossos artigos. Dentre eles, selecionamos alguns abaixo, que podem ser lidos na nossa Seção Brasil, disponível em https://www.atitoxavier.com/my-blog/categories/brasil:
- Série Vulnerabilidades do Brasil: Atlântico Sul;
- Brasil: precisamos ter uma estratégia marítima para o século XXI;
- Elevação do Rio Grande: oportunidade e vulnerabilidade para o Brasil;
- Inimigo à vista: Pesca ilegal - ameaça que se aproxima cada vez mais do Brasil;
- Análise da pesquisa sobre possíveis tendências e cenários, até 2040, que podem impactar o Brasil; e
- Sistemas A2/AD: precisamos para a defesa da nossa fronteira oriental (Atlântico Sul)?
Apesar do sucesso e da importância do lançamento desses satélites, tanto o foguete utilizado para lançá-los, quanto a tecnologia de desenvolvimento deles é estrangeira, o que poderá dificultar as nossas aspirações de termos uma tecnologia espacial própria.
Cabe refletir se o Brasil seguirá a atual política espacial dos EUA de terceirizar o lançamento e exploração do ambiente espacial, conforme falamos em nosso artigo "A nova corrida espacial e a geopolítica do espaço: A Era da Competição entre as Grandes Potências". Segue uma parte da matéria:
"Na corrida espacial da atualidade a estratégia dos EUA é apostar na iniciativa privada, como as empresas Space X, AXIOM Space além de outras, o que tem como vantagens a diminuição dos investimentos estatais nesse tipo de empreendimento, permite que a inovação tecnológica seja mais célere, bem como uma implementação mais rápida de tais tecnologias. Dessa forma, a NASA passaria ser mais um cliente de tais empresas."
O excelente artigo "FAB lança os primeiros satélites de observação da Terra", de Matheus Marculino dos Santos*, aborda esse assunto, bem como faz uma análise desse projeto. Recomendamos a sua leitura que pode ser feita no Blog por meio do link: https://de9abb8c-83aa-4859-a249-87cfa41264df.usrfiles.com/ugd/de9abb_2b9f5e30243a4cc7aad4c6182a41a5df.pdf .
Seguem alguns trechos desse artigo:
"Algo inovador deste projeto é a tecnologia radar , uma aplicação de uso dual e ainda não dominada pelo governo brasileiro. Essa tecnologia de alta resolução permite o monitoramento do território em diferentes condições meteorológicas, em ambientes noturnos e quando há cobertura de nuvens. Isso é um fator estratégico para ampliar a soberania brasileira no controle da Região amazônica e da Amazônia Azul, uma extensa área geográfica que compreende o litoral brasileiro por onde passam boa parte das exportações brasileiras. [...] Contudo, apesar do Projeto Lessonia-1 ser um marco importante no monitoramento do território brasileiro e para diversas aplicações na área de segurança, ele não foi desenvolvido pela indústria nacional. Ou seja, não houve o aprendizado tecnológico necessário para o aprofundamento do conhecimento na área espacial pelos técnicos brasileiros. E sim, a compra de um equipamento de uma tecnologia de ponta de um país desenvolvido que a detêm. O principal aprendizado tecnológico do satélite será no campo da sua operação pelo Ministério da Defesa. Um outro fator é que ele não foi lançado a partir do Centro Espacial de Alcântara (CEA), um dos melhores centros de lançamento do mundo e próximo à Linha do Equador, e sim de um Centro Espacial dos EUA. Dessa forma, a compra de um satélite e o seu lançamento fora do território brasileiro não desenvolveu as potencialidades espaciais do nosso país, que continuam à margem dos principais atores espaciais. "
Um outro ponto positivo do Projeto Lessonia, além dos citados anteriormente, é a menor dependência brasileira dos satélites de potências estrangeiras para os assuntos de defesa, pois poderemos acessá-los a qualquer tempo e hora. Esse ponto de vista também é dividido com Matheus Marculino dos Santos, quando nos diz:
"Com o lançamento deste novo satélite, o Brasil reafirma a sua soberania espacial ao diminuir a sua dependência de satélites estrangeiros para monitorar o território brasileiro e se posiciona como o principal ator espacial na América Latina. [...] Ademais, ressalta a presença brasileira no New Space com satélites menores, mais eficientes e mais baratos que trazem um grande benefício à sociedade brasileira. Por último, os satélites do Projeto Lessonia-1 ampliam a capacidade de defesa do território brasileiro ao projetar poder sobre o território brasileiro e integrar os serviços espaciais ao terrestre e marítimo. Isso tem efeitos na geopolítica espacial ao expandir o poder espacial brasileiro e na diminuição da vulnerabilidade de monitoramento do território."
O Blog é de opinião de que foi dado um passo muito importante para aprimorar o monitoramento e o controle das nossas fronteiras. Além disso, poderá contribuir, no futuro próximo, para a elaboração de uma Estratégia Marítima Brasileira do Século XXI, além de uma Estratégia A2/AD Conjunta, que temos tanto defendido.
Outrossim, cabe uma reflexão se seguiremos a tendência estadunidense de apostar na iniciativa privada espacial, ou se desenvolveremos uma tecnologia própria, que consideramos importante estrategicamente para a defesa do nosso país.
Qual a sua opinião?
Seguem alguns vídeos para ajudar as nossas análises:
Matéria de 26/05/2022:
Matéria de 27/05/2022:
Matéria de 26/05/2022:
Matéria de 26/05/2022:
Matéria de 27/05/2022:
* - Matheus Marculino dos Santos é Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (PPGRI-UERJ), e colaborador do Blog.
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