A influência das ideias do estrategista naval Alfred Thayer Mahan foi crucial para os EUA, pois lançou as bases para formar a sua atual marinha (US Navy), bem como a sua Estratégia Naval, transformando esse país em uma potência naval que contribui para atingir os objetivos geopolíticos estadunidenses.
O documento Naval Doctrine Publication 1 Naval Warfare, datado de abril de 2020, que pode ser acessado no Blog em https://de9abb8c-83aa-4859-a249-87cfa41264df.usrfiles.com/ugd/de9abb_883a6625fade4683bb5822643f75e346.pdf, é uma publicação doutrinária dos US Naval Services (US Navy, US Marine Corps e US Coast Guard), sendo fundamental para entender como operam, e com isso podemos entender como os EUA veem o emprego do seu Poder Naval na Guerra Naval moderna. Dessa forma, veremos o pensamento e influência mahaniana, e recomendamos a leitura.
Das ideias de Mahan, que podem ser conhecidas em sua obra The Influence of Sea Power Upon History, ressaltamos que o comércio marítimo mundial é fundamental para a prosperidade do Estado, e para tanto é necessário possuir uma marinha que assegure a proteção das suas Linhas de Comunicações Marítimas, não sendo admissível terceirar essa tarefa para outro Estado. Como o comércio é em escala global, o apoio logístico para assegurar a permanência e presença no mar, ao redor do mundo, dessa marinha torna-se fundamental. Sendo assim, é primordial possuir bases navais fora do país.
Após a ascensão ao poder do líder chinês Deng Xiaoping a China começa a realizar reformas econômicas, tendo como objetivo abrir a sua economia mantendo um forte controle político, e para tanto o comércio mundial começa adquirir importância para o crescimento e prosperidade do país. Para tanto, isso só seria possível por meio do mar.
Todos os seus sucessores seguem as suas diretrizes, chegando até o atual líder chinês, Xi Jinping, em que a marinha chinesa, conhecida por People's Liberation Army Navy (PLA Navy) ou Chinese Navy, conseguiu ultrapassar a US Navy em números de navios.
Para tanto, a China baseou-se, também, em Mahan, mas com influência de pensadores chineses, onde uma ideia que se destaca é defesa ativa, surgindo o conceito de Anti-Acess / Area Denial ou A2/AD, que seria uma forma de dificultar uma possível projeção de poder ao território chinês pelo mar. Em paralelo ao desenvolvimento e implementação do A2/AD, o governo de Pequim começa a formar sua frota mercante, bem como uma marinha de guerra com capacidade de rivalizar com as grandes marinhas do cenário internacional. Além disso, o outro objetivo da China em se ter uma marinha forte é evitar o período das humilhações, onde a China foi invadida e conquistada pelo mar.
Dessa forma, vemos a China se tornar a segunda economia mundial, com os seus navios de guerra iniciando uma presença global, bem como iniciando a implementação de bases navais no exterior, como Djibuti. Além disso, o seu projeto Belt and Road Iniciative - BRI, tem previsto o investimento nos portos dos países parceiros do projeto. Convém mencionar que alguns desses Estados, em troca do financiamento, abriram mão da exploração portuária para o governo de Pequim, que está desenvolvendo uma infraestrutura para a atracação de seus meios navais.
Nesse sentido, iniciou-se um acirramento da disputa pelo comércio e influência geopolítica mundiais entre os EUA e a China, pois para um desses países incrementar a sua prosperidade, por vezes, conquista-se ou diminui o mercado do outro, e como Pequim e Washington dependem do comércio marítimo e possuem Estratégias Navais semelhantes tornou-se inevitável a competição e tensão entre suas marinhas. Tais fatos foram potencializados pelo desejo de atingir o "sonho chinês"até 2049 (política de Xi Jinping), e com a consequente busca por recursos no mar, como as reservas de petróleo e gás no Mar do Sul da China, pesca etc, onde em sua tentativa de expansão chocou-se contra os países asiáticos que possuem laços com os EUA, sendo alguns aliados estratégicos como o Japão.
No tocante a Taiwan, a China nunca abrirá mão desse território, pois o considera como um "aeroporto" que pode projetar poder contra o solo chinês, tal tema foi abordado em alguns artigos que podem ser lidos na Seção China, que pode ser acessada no link https://www.atitoxavier.com/my-blog/categories/china. Dessa forma, Pequim utiliza a PLA Navy para tentar pressionar e desestabilizar o governo taiwanês e enviar uma mensagem a todos os atores envolvidos que uma declaração de independência formal de Taiwan não será tolerada.
O Blog vem abordando as Estratégias Navais chinesa e estadunidense em vários de seus artigos, onde destacamos:
"A nova estratégia naval dos EUA: ameaças russa e chinesa, sendo a chinesa a preponderante", disponível em https://www.atitoxavier.com/post/a-nova-estratégia-naval-dos-eua-ameaças-russa-e-chinesa-sendo-a-chinesa-a-preponderante, que demonstra que os EUA necessitam de aliados para se contraporem aos desafios vislumbrados, notadamente a China, e que sozinhos não são capazes de manter as linhas de comunicações marítimas livres e seguras, pois mais da metade de seu poder naval está concentrado no Indo-Pacífico e Pacífico Ocidental, em virtude da ameaça chinesa aos seus aliados e a sua influência geopolítica, e mostra o caminho para que em 2030 as suas forças navais continuem sendo dominantes no cenário internacional, e que se investimentos não forem realizados em seu poder naval poderá haver um grande impacto em sua liderança mundial;
"Instabilidade na região do Indo-Pacífico e a possível recriação da Primeira Esquadra dos EUA", acessível em https://www.atitoxavier.com/post/instabilidade-na-região-do-indo-pacífico-e-a-possível-recriação-da-primeira-esquadra-dos-eua, onde afirmamos que apesar dos chineses possuírem uma marinha moderna e em franca expansão, ainda estão num nível abaixo dos estadunidenses, mas que em breve os ultrapassarão em letalidade e tecnologia, sendo primordial que os EUA, visando manterem-se como potência naval hegemônica, construírem alianças que possam conter o expansionismo chinês, e para tanto faz-se necessário aumentar a sua presença global, bem como aumentar e modernizar a US Navy, e que é muito provável a criação de uma Esquadra dedicada a região do Indo-Pacífico, que tem tido aumentada a sua importância geopolítica, não somente devido a ameaça chinesa, mas também em razão da futura presença russa com uma base no Sudão;
"Dragão sonhador ou dominador?", disponível em https://www.atitoxavier.com/post/dragão-sonhador-ou-dominador, abordamos que desde a ascensão de Mao, passando por Deng Xiaoping (visionário da abertura chinesa) e chegando em Xi Jinping, vemos uma China não cometendo os erros do passado, indo adiante com os aprendizados ao longo de sua história. Com isso, fica a pergunta, o que a China deseja? Será realizar o sonho chinês proposto do Xi Jinping de que o país será respeitado globalmente, sua população viverá com qualidade de vida e nunca mais passará por humilhações, e que se todos trabalharem duro esses objetivos serão alcançados. Por isso, vemos um grande desenvolvimento em todas as áreas e um sentimento nacionalista chinês crescente, o que gera no mundo uma grande apreensão e espanto. Tal lógica pode ser relacionada com os ideias norte-americanos do passado e o pensamento calvinista. Porém, seria somente isso, ou a China aspira ser uma superpotência dominadora? Dessa forma, precisamos entender o que a China ambiciona, ser grande novamente como na época de Marco Polo ou ser dominadora. Só assim poderemos responder a outra indagação: a China é oportunidade ou ameaça? Poderemos considerar como um grande parceiro ou perigo a nossa sociedade?
"A limitação geográfica marítima chinesa e sua vulnerabilidade geopolítica", acessível em https://www.atitoxavier.com/post/a-limitação-geográfica-marítima-chinesa-e-sua-vulnerabilidade-geopolítica, onde afirmamos que a China possui uma limitação geográfica marítima importante para sua defesa, e para um possível controle de área marítima do Mar da China Oriental e do Mar do Sul da China, pois ela é cercada por países que não a enxergam como aliada, mas com muito receio e desconfiança e que a região marítima citada possui vários recursos importantes a serem explorados como reservas de gás, óleo, pesca etc, e como consequência a China vem disputando de forma incisiva os territórios marítimos com os seus vizinhos. Além disso, a estratégia chinesa de defesa marítima pode ser resumida em 3 fases: a) controlar a área marítima no interior da primeira linha de ilhas, com isso tem adotado uma política marítima agressiva com a construção de ilhas artificiais com a instalação de bases aéreas e lançadores de mísseis no Mar do Sul da China, manobras intimidadoras com outras marinhas etc; b) controlar a área marítima até a segunda linha de ilhas por volta de 2050, para tanto tem construído navios robustos e submarinos modernos; c) acabar com o domínio e influência dos EUA nos Oceanos Índico e Pacífico;
"A Estrela Vermelha: o crescimento da marinha chinesa e os seus impactos geopolíticos", que pode ser acessado em https://www.atitoxavier.com/post/a-estrela-vermelha-o-crescimento-da-marinha-chinesa-e-os-seus-impactos-geopolíticos, onde afirmamos que a China tem durante os últimos 25 anos investido na modernização e no crescimento de sua força naval, se tornando numa das marinhas mais poderosas no cenário internacional baseando-se na US Navy, bem como adotando uma estratégia marítima e naval com similaridades com a do estadunidense Alfred Thayer Mahan, que o atual governo chinês tem adotado políticas assertivas em busca de seus objetivos geopolíticos, e está utilizando o seu poder naval para isso, que o planejamento do desenvolvimento poder naval chinês possibilitou que a China se contraponha as possíveis agressões externas pela via marítima, ainda mais quando empregado em conjunto com os seus sistemas de anti-acesso e negação de área, ou anti-acess/area denial (A2/AD), mitigando uma de suas vulnerabilidades estratégicas, e que o projeto chinês Belt and Road Iniciative poderá permitir a utilização dos portos estrangeiros por meios navais da China, e que esse país considera o seu poder naval como um instrumento fundamental em sua política de implementar o "Sonho Chinês".
Em que pese a tensão constante entre esses países no mar, achamos pouco provável um conflito entre eles, devido as seguintes análises:
a China é um país isolado, que não possui um grande número de aliados militares. Em nossa visão seriam somente a Coreia do Norte e o Paquistão, apesar de possuir parcerias militares, mas não tratam-se de alianças. Pelo outro lado, os EUA possuem várias alianças militares estratégicas e que foram consolidadas na história, como Japão, OTAN, dentre outras e que poderiam apoiar Washington num conflito;
a prosperidade chinesa, atualmente, depende do comércio marítimo, principalmente com os EUA, e um conflito levaria a uma grande perda de mercado, o que estrangularia a sua economia. Por isso, a sua urgência em desenvolver o seu mercado interno com a política do "sonho chinês" e a diminuição da dependência dos mercados alinhados a Washington;
apesar da China ter uma marinha em franca expansão, não possui tradição em guerras navais, como os EUA, e a sua atual cultura naval não foi forjada em conflitos, o que carrega uma incerteza nas possíveis decisões sob pressão de seus líderes, bem como as suas tripulações reagiriam em estresse de combate;
na história recente, desde o fim da Segunda Guerra Mundial até os dias atuais, não vimos um conflito entre grandes potências, mas tensões e uso de outras formas de conflito indireto, como GRAY ZONE, o que já vem acontecendo.
Entretanto, os EUA verificaram que a expansão naval chinesa é uma ameaça a sua condição de potência naval dominante e enxerga a PLA Navy como uma desafiante ao seu status quo, ainda mais pela postura agressiva com que essa marinha vem atuando nas disputas no Pacífico Ocidental. Dessa forma, a US Navy decidiu adotar uma postura mais assertiva, principalmente contra a China, e vem estimulando o seu governo a aumentar os investimentos em sua marinha, a fim de manter-se como a potência naval hegemônica no cenário internacional.
Nesse sentido, o Chief of Naval Operations - CNO, Adm. Mike Gilday promulgou, em janeiro deste ano, a sua visão para a US Navy no documento CNO NAV PLAN 2021, disponível no Blog em https://de9abb8c-83aa-4859-a249-87cfa41264df.usrfiles.com/ugd/de9abb_27ac363e4b624e12aaa4a23a03e883ed.pdf, que informa como será a postura dessa marinha para fazer frente aos principais desafios, dentre eles ratifica a China como a principal. Tal documento foi baseado no Tri-Service Maritime Strategy, que abordamos no artigo "A nova estratégia naval dos EUA: ameaças russa e chinesa, sendo a chinesa a preponderante", e que tem como pilares, explicados de forma resumida: readiness (ter uma força naval com maior prontidão), capabilities (possuir uma força com maior letalidade e com sistemas de combate e de comando e controle mais avançados), capacity (desenvolver uma força híbrida com meios tripulados e não tripulados, com o intuito de saturar as defesas adversárias, vencer guerras no mar e de projetar poder), e sailors (aperfeiçoar a formação e qualificação do pessoal da US Navy, transformando-os em melhores combatentes). Ademais, confirma a importância dos aliados e a necessidade de uma postura mais assertiva.
O Blog é de opinião de que não é esperado um conflito no mar entre a China e os EUA em curto e médio prazos, pois os dois países teriam muito a perder, especialmente o governo de Pequim pelos motivos expostos anteriormente. Porém, continuaremos assistindo uma política de ameaças chinesas, como vem realizando nas tensões na região marítima do Mar do Sul da China e da China Oriental (com o intuito de se afirmar internamente e demonstrar força externamente), bem como os dois países continuarão se testando, vendo os limites de até onde podem chegar.
Nesse sentido, ratificamos a nossa opinião de que somente um grande erro no cenário tático é que poderá escalar a crise em possível conflito, e que não é esperado que aconteça.
Qual a sua opinião? Você acredita numa guerra naval entre a China e os EUA?
Nessa matéria não colocaremos vídeos sobre o assunto, pois existem vários que podem ser revistos nos artigos citados no texto, e que são relevantes para auxiliar nas análises do leitor.
Não creio em conflito armado, salvo um grande erro tático de algum chefe naval em um momento de tensão. A atual política estadunidense também parece ser menos "dedicada" a defesa de interesses que se contraponham aos chineses (ao contrário).
Se desejarem manter-se como o "leão da montanha" dos oceanos, creio que os estadunidenses devessem voltar a pensar em revitalizar as marinhas de seus aliados, como fez no passado, fornecendo material e treinamento é recebendo em troca locais de manutenção e reabastecimento de seus navios, como já buscam com a Cost Guard no combate à pesca ilegal.